SOJA
Cobrança de royalties racha bloco pró-transgênicos
Monsanto quer cobrar taxa retroativa, de R$ 1 a R$ 1,50 por saca de soja.
Parlamentares e produtores consideram valor elevado e querem pagamento na hora
da compra da semente.
Maurício Hashizume - 6/11/2003
Brasília - Os defensores da liberação do cultivo e da comercialização
da soja transgênica estão divididos. Realizada nesta quarta-feira
(5) na Câmara Federal, a reunião entre parlamentares e representantes
da Monsanto expôs divergências com relação à
forma de cobrança da taxa tecnológica sugerida pela empresa que
domina o mercado de soja transgênica por deter a patente da Roundup Ready.
O presidente da Monsanto do Brasil, Richard Greubel Jr., declarou à imprensa
que avisara os produtores, em setembro de 2002, por meio de anúncios em
jornais, que poderia cobrar pela utilização das sementes desenvolvidas
com a utilização da tecnologia da empresa, mesmo que contrabandeadas.
"Cobraremos, a partir de agora, uma taxa sobre o ganho real pelo uso da nossa
tecnologia no Brasil. A Monsanto investe US$ 1 milhão por dia em pesquisas",
afirmou. O valor exato da taxa, segundo ele, ainda não foi definido. "Mas
a nossa intenção é cobrar no momento da venda", anunciou,
completando que a empresa está aberta para rodadas de negociações
com os produtores.
"A questão das cobranças dos royalties suscitará um debate
muito grande. A Monsanto apresentou algumas cifras provisórias que apontam
para uma taxa de 25% do valor agregado pela utilização da tecnologia,
que daria R$ 1 a R$ 1,50 por saca de soja", projetou o deputado federal Paulo
Pimenta (PT-RS), que convocou a reunião por ser relator da recente MP envolvendo
a próxima safra de soja transgênica. "Isso ainda passará por
análises jurídicas e por muitas negociações. Acho
o valor sugerido (pela Monsanto) bastante elevado e não tenho convencimento
jurídico de que a empresa possa cobrar royalties desde já. Quem
comprou essa semente modificada já pagou a mais", argumentou o notório
defensor da liberação dos transgênicos.
Árduo defensor da liberação do cultivo e da comercialização
da soja transgênica no Brasil, o deputado federal Darcísio Perondi
(PMDB-RS), que também participou da reunião, disse não concordar
com a forma de cobrança proposta pela Monsanto. "Vou defender que eles
só cobrem daqui pra frente, e não de forma retroativa, daquilo que
já foi cultivado".
"Tenho conversado com a Monsanto, sei da posição deles, mas acho
muito difícil eles conseguirem cobrar royalties do que já está
plantado", repetiu Ezídio Pinheiro, presidente da Fetag-RS (Federação
dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul), que representa cerca de
86% das famílias produtoras de soja no Estado e apoiou a recente MP. "Concordamos
com a cobrança, mas na hora da compra da semente devidamente certificada.
A disposição deles é de negociar. Garanto que nós
vamos procurar todas as formas de não pagar na hora da venda. Pelo que
tudo indica, haverá disputa judicial."
O presidente da Fetag-RS, que foi informado dos resultados da reunião por
conversa telefônica com o deputado Pimenta, completou dizendo que a recente
MP assinada pelo governo provocou muita confusão para os produtores. "Muita
gente que plantou soja convencional está declarando que tem transgênicos
por medo da multa. A medida permite a plantação de soja contrabandeada
e proíbe a certificada."
As diferentes posições a respeito da forma de cobrança dos
royalties, no entanto, não impediram alguns acertos na reunião entre
o relator da MP e os representantes da Monsanto. Três foram os pontos de
convergência apresentados por Pimenta. A empresa se comprometeu a disponibilizar
seus relatórios - incluindo estudos relativos à saúde humana,
ao meio ambiente e ao aspecto da agronomia -, tanto os preliminares quanto os
novos, que estão em fase de conclusão. Outro compromisso firmado
foi a inclusão de um artigo no relatório da MP que responsabiliza
a Monsanto por possíveis danos provocados pela sua soja transgênica,
conforme estabelece a Lei de Biossegurança enviada ao Congresso pelo Executivo.
Por fim, ficou acertada a realização de uma audiência pública
com a presença da Monsanto e de outras empresas que desenvolvem OGMs (Organismos
Geneticamente Modificados), como a Syngenta e a Bayer.
Enquanto isso, no comércio internacional...
Em 10 de junho deste ano, a Monsanto enviou um "Aviso importante a importadores
de Produtos de Soja do Brasil". Diz o texto: "A partir de julho de 2003, a Monsanto
vai instituir um sistema de monitoramento de embarques de produtos de soja do
Brasil para assegurar que seus direitos de propriedade intelectual sejam protegidos.
Se V.Sa. planeja receber embarques de produtos de soja do Brasil, recomendamos
que confirme com seu fornecedor se os produtos estão totalmente licenciados
para evitar a infração dos direitos de propriedade intelectual da
Monsanto. A omissão neste sentido fará que V.Sa. corra o risco de
ação(ões) de execução, inclusive a possibilidade
de os embarques ficarem sujeitos a inspeção e testes de possível
retenção em custódia no ponto de importação".
Munida de uma cópia do memorando da empresa, a deputada federal Lucy Choinacki
(PT-RS), outra participante da reunião, fez contundentes comentários.
"A estratégia da Monsanto ficou clara nessa reunião. Se pegarmos
a história do Brasil, você vai perceber que a soja, hoje, é
o nosso grande produto de exportação, como já foi a cana-de-açúcar,
o café, a borracha, o algodão, etc. Eles devem cobrar uma taxa muito
baixa no começo, como uma chupetinha, para anular o potencial de produção
da soja brasileira. Depois, como eles mesmos disseram, a cobrança deve
aumentar. A Monsanto está evidentemente de mãos dadas com o governo
dos EUA para tentar dominar a soja brasileira, única competidora mundial
sobre a qual eles ainda não têm controle."
O diretor de marketing da Monsanto do Brasil, Felipe Osório, confirmou
que a notificação aos importadores de soja brasileira foi repassada
para cooperativas de produtores. "A lei de rotulagem exige a identificação
da soja na nota fiscal, mas ainda não definimos como será exatamente
o nosso sistema de controle", explicou, admitindo que a empresa está estudando
a viabilidade e a execução de fiscalizações e testes
em portos espalhados pelo mundo. "O importante é que o produtor pague os
royalties."
fonte:Agência Carta Maior, 6/11/2003
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