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Perigo à mesa: Cuiabá não produz orgânicos por falta de estrutura

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Não há muitas informações sobre todos os tipos de produtos utilizados na conservação de frutas e verduras |

Nenhuma propriedade dentro de Cuiabá produz alimentos orgânicos o suficiente para abastecer o grande mercado local. A falta de interesse, de acordo com Dorival Rigotte, presidente da Associação dos Agricultores Familiares do Município, é devido à falta de infraestrutura para garantir o abastecimento regular do comércio.

Estradas em péssimo estado e o transporte encarecem o custo da produção, principalmente em se tratando de orgânicos, que levam pelo menos três dias a mais para ficar no ponto da colheita em relação àqueles tratados com produtos químicos.

“O orgânico, sem dúvida, tem muito mais qualidade, e nós, da agricultura familiar, temos interesse em produzi-lo e só não investimos porque não temos a certeza de que vamos conseguir entregar a mercadoria em tempo hábil e com a garantia da venda”, frisa Dorival. Ele reconhece que os não orgânicos crescem mais rapidamente e têm uma aparência melhor que os cultivados de forma natural. No entanto, entende também que a tendência é de que o consumidor procure cada vez mais os orgânicos, que são muito mais benéficos à saúde e causam menos danos ao meio ambiente.

A falta de produtos orgânicos no mercado deixa o consumidor sem escolha | Fotos: Mary JurunaPara ele, só o fato de o agricultor familiar ter um lugar para vender já seria um grande negócio. “O governo construiu um centro de abastecimento em Várzea Grande, e que fica muito longe do consumidor. Em Cuiabá, temos o Programa de Aquisição de Alimentos, mas dificilmente conseguimos vender nossos produtos, porque sempre que o agricultor chega lá já tem outro fornecedor cadastrado”, reclama.

Dorival Rigotte conta que existem em Cuiabá algumas produções de orgânicos (no máximo 1 hectare) e que conseguem abastecer somente pequenos comércios. “O resto vem tudo de fora pelas mãos do atravessador”, lamenta o agricultor, na expectativa de que a Prefeitura cumpra o acordo firmado em janeiro deste ano que é de adquirir no mercado local pelo menos 30% dos alimentos usados na merenda escolar. “Se a lei for realmente cumprida, seremos beneficiados com estradas, pontes, regularização fundiária, água, toda uma infraestrutura necessária para garantirmos a produção, sem prejuízos”, completa Dorival lembrando que algumas propriedades não dispõem nem de luz elétrica.

Procura é grande

Professor, médico e doutor na área de toxicologia Wanderlei Pignati | Fotos: Mary JurunaO consumo de frutas, verduras e legumes é alto em Cuiabá. De acordo com o responsável pela compra desses produtos na rede de supermercados Modelo, Manfrinnes Ribeiro Borges, são vendidos 30 mil pés de alface e 20 de couve só nos estabelecimentos de Cuiabá e Várzea Grande. Ele reclama que há poucos produtores de hortaliças locais: “Eu compro só de quatro fornecedores e ainda falta capacitação pra fazer as triagens, nem tudo serve para o mercado”, conta.

Uma saída são os chamados alimentos orgânicos que são aqueles que não são fazem uso de nenhum tipo de agrotóxico. Mas não é tão fácil assim encontrá-los na capital. De acordo com Manfrinnes Borges, “o orgânico já tem um mercado garantido, a demanda existe, apesar de chegar a ser 100% mais caro, a grande dificuldade é encontrar produtores”, relata. A rede de supermercados Big Lar, que comercializa produtos orgânicos, recusou-se a divulgar informações sobre quantidade de vendas, fornecedores e estocagem, quando procurada pela reportagem do Circuito MT.

Controle

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é a responsável pela análise, controle e fiscalização de produtos e serviços que envolvam risco à saúde, bem como dos agrotóxicos, componentes e outras substâncias químicas de interesse toxicológico.

Contudo uma das medidas de segurança implementadas no país diz respeito a um conjunto de normas previstas na legislação que determinam a quantidade do produto pode ser usada. As definições de parâmetro levem em consideração condições ambientais, climáticas e espécies de pragas; assim é possível mapear o tipo de agrotóxico usado em cada local.

O respeito às normas garante que apenas resíduos químicos considerados "toxicologicamente aceitáveis" fiquem nos alimentos que chegam até os consumidores, apesar de os defensivos agrícolas serem classificados como altamente venenosos.

Mas não é isso o que se verifica na produção. O último balanço divulgado pela Anvisa dá conta que a maioria dos alimentos mais consumidos dentro do mercado hortifrúti apresenta índices considerados perigosos para a saúde devido ao excesso de agrotóxicos. São eles: pimentão (80%), uva (56,40%), pepino (54,80%), morango (50,80%), couve (44,20%), abacaxi (44,10%), mamão (38,80%), alface (38,40%), tomate (32,60%) e beterraba (32%).

Médico critica órgãos fiscalizadores

O doutor na área de toxicologia Wanderlei Pignati é incisivo ao avaliar a falta de controle na comercialização de alimentos produzidos à base de produtos químicos. “A Anvisa não funciona como deveria, o governo não quer gastar e não investe em laboratórios com equipamentos e produtos para detectar resíduos maléficos nos alimentos”.

A couve é a segunda hortaliça mais consumida na região e uma das mais contaminadas

Com cerca de 900 princípios ativos em mais de 4 mil formulações diferentes, os chamados defensivos agrícolas, ou agrotóxicos, estão presentes em 98% dos alimentos que consumimos. De acordo com Pignati, na última safra Mato Grosso utilizou 105 milhões de litros de agrotóxicos, mais de 10% do total do país.

Além do impacto imediato na saúde, o professor Pignati ainda faz o alerta para os riscos ambientais: “Quando você mexe com agrotóxico e fertilizante químico em Mato Grosso, é preciso considerar as três grandes bacias hidrográficas: a do Araguaia, Amazônica e a do Pantanal”. No caso da Bacia do Pantanal, as proporções são internacionais, atingindo países vizinhos como Paraguai, Argentina e Uruguai.

Os agrotóxicos não são os únicos “venenos” que podem chegas às mesas. Também tem sido usado um produto à base de sanificante, que só pode ser aplicado em pequenas quantidades para que não cause danos ao organismo das pessoas. Ele é aplicado na etapa pós-colheita de frutas e hortaliças porque, devido à sua formulação, o aspecto visual e as propriedades iniciais desses produtos são conservados por mais tempo. Seu uso garantiu um aumento de 360% nas vendas, mas a Anvisa ainda não mostrou resultados quanto à fiscalização, ou seja, não sabe a quantidade utilizada nem os possíveis impactos para a saúde. Outro ponto importante é que o consumidor não é avisado.

Como retirar os resíduos

Os agrotóxicos penetram na parte externa do fruto ou da folha, se usados como a lei determina. Assim, a recomendação que a nutricionista Thaís Pedrollo de Paes faz é que sejam seguidos os seguintes procedimentos antes de consumir: deixe de molho na água de 10 a 15 minutos, depois coloque uma colher de hipoclorito de sódio por litro de água e coloque de molho novamente pelo mesmo tempo.

Assim, além de eliminar os resíduos tóxicos, é possível matar os micro-organismos que podem causar doenças. A nutricionista ainda alerta que é preciso cuidado, uma vez que muitos alimentos podem conter agrotóxicos além do nível aceitável ao organismo: “O procedimento pode não eliminar tudo, mas resolve grande parte”. Com o tempo, os venenos “levam a doenças neurológicas, aumentando o risco de desenvolver o mal de Alzheimer e o de Parkinson”, explica Paes.

Fonte: Circuito MT por Sandra Carvalho e Andhressa Sawaris Barboza –em 14 Junho 2012

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