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POR UM BRASIL LIVRE DE TRANSGÊNICOS
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Número 468 - 20 de novembro de 2009
Car@s Amig@s,
Cientistas denunciam perseguição e "poder de veto" da indústria de biotecnologia para pesquisas sobre efeitos dos transgênicos
Finalmente os pesquisadores (norteamericanos, ao menos) estão começando a denunciar as pressões e ameaças que sofrem quando ousam desafiar a indústria de biotecnologia ao desenvolver e publicar pesquisas que analisem os efeitos dos transgênicos para a saúde ou o meio ambiente.
Já havíamos divulgado no Boletim 452 o editorial publicado pela revista Scientific American em agosto deste ano, relatando como as empresas conseguem se valer das leis de propriedade intelectual para obter controle absoluto sobre o que pode e o que não pode ser publicado em relação às suas sementes.
Agora foi a vez da revista científica Nature Biotechnology publicar um artigo (outubro de 2009) denunciando o mesmo problema.
Segundo o artigo, "não é segredo que a indústria de sementes tem o poder de moldar as informações disponíveis sobre lavouras transgênicas. Foram empresas privadas que desenvolveram praticamente todas as sementes que estão no mercado norteamericano, e os direitos de propriedade intelectual sobre a tecnologia permite que elas decidam quem vai estudar as lavouras e como."
O controle das empresas começa com um simples contrato para produtores. Qualquer pessoa que queira comprar sementes transgênicas precisa assinar um contrato de tecnologia que diz, entre muitas outras coisas, que o comprador não pode conduzir pesquisas com as sementes, e nem dá-las a outrem para a realização de pesquisas. Para fazer pesquisas, os cientistas precisam pedir permissão às empresas, especificando o que pretendem fazer com as plantas -- ou correm o risco de ser processados.
As empresas de sementes podem negar os pedidos com base em qualquer razão -- e, conforme ilustra o artigo, algumas vezes elas são bem criativas. Outras vezes, são simplórias: em um caso relatado, a Pioneer Hi-Bred disse a um pesquisador que "não dispunha de material apropriado para fornecer".
Quando a empresa e os pesquisadores conseguem concordar em um projeto de pesquisa, eles precisam negociar os termos do acordo. Segundo pesquisadores, muitos destes acordos costumam travar quando as empresas querem controlar ou bloquear a publicação da pesquisa.
Também são impressionantes os relatos de manipulação de dados praticados pelas empresas. Um caso descrito no artigo foi de um milho da Pioneer tóxico a insetos. Em 2001 a empresa contratou alguns laboratórios de universidades para estudar efeitos indesejados do milho em uma espécie de joaninha. Os laboratórios descobriram que quase 100% das joaninhas que foram alimentadas com o milho morreram no oitavo dia do ciclo de vida. Quando os pesquisadores apresentaram seus resultados à Pioneer, a empresa os proibiu de divulgar os dados. Como a variedade de milho ainda não era comercializada, o acordo de pesquisa dava à Pioneer o direito de vetar a publicação dos resultados.
Dois anos depois a Pioneer recebeu autorização para comercializar um milho que continha exatamente a mesma toxina daquele usado nos experimentos com as joaninhas. Mas os dados submetidos ao EPA (Agência de Proteção Ambiental do governo americano, na sigla em inglês) não informavam os efeitos sobre as joaninhas -- apesar de a empresa ter seguido os protocolos normais de pesquisa. Num dos estudos da Pioneer, a empresa forneceu a toxina purificada às joaninhas até o sétimo dia de vida -- um dia antes do que havia sido observado como o estágio mais suscetível. Em um segundo estudo, a empresa acompanhou as joaninhas até o final do ciclo de vida, mas usou um modo diferente de alimentação, fornecendo um pó homogeneizado contendo metade presas (pequenos animais dos quais elas se alimentam, como insetos e ácaros) e metade pólen, e não verificou nenhum efeito.
Segundo um dos pesquisadores envolvidos com a primeira pesquisa, a EPA foi informada da pesquisa independente, mas preferiu não agir. E a Pioneer não daria permissão aos cientistas para refazer o experimento.
Também sobre este tema, um outro artigo [1] publicado pela renomada revista científica Nature em setembro deste ano apresentou em detalhes a saga que atravessam os cientistas que se arriscam a publicar pesquisas indicativas de efeitos maléficos dos transgênicos.
O caso apresentado em maior detalhe é o das pesquisadoras Emma Rosi-Marshall e Jennifer Tank, que em 2007 publicaram um estudo indicando que as larvas de um inseto herbívoro da ordem trichoptera que vivem em pequenos cursos d'água no norte de Indiana (EUA), onde as lavouras de milho Bt (tóxico a insetos) se espalham até onde alcança a vista, também são afetadas pelo Bt. No artigo, publicado na revista científica PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences), as autoras concluem que o plantio disseminado de lavouras Bt provoca consequências inesperadas em escala de ecossistemas.
A reação furiosa de cientistas pró-transgênicos foi imediata. Em apenas duas semanas, diversos pesquisadores já haviam escrito para as autoras, para a revista PNAS e para a Fundação Nacional de Ciência (NSF, em inglês) do governo americano, que financiava o trabalho de Rosi-Marshall. O trabalho foi acusado de falho, omisso, mal desenhado, entre outras coisas.
Um dado interessante apontado por Arthur Benke, um dos cientistas que prestaram apoio às autoras afirmando o valor dos dados publicados, é que absolutamente nenhuma das críticas sugere o aprofundamento das pesquisas sobre o caso. "O que relatórios como este fazem é nos alertar sobre possíveis razões para analisarmos a questão com mais cuidado", diz ele. Allison Power, pesquisadora de ecologia e biologia evolutiva da Cornell University, complementa: "Tentar desmentir a pesquisa imediatamente é um ato que ignora como a ciência deve funcionar: você formula uma hipótese, testa-a, refina-a, testa-a e refina-a novamente. Você segue fazendo isso até conseguir uma resposta que seja tão próxima quanto possível da que se pode obter. Não entendo que exista resistência a esta noção".
Embora o artigo da Nature conceda muito espaço para os cientistas pró-transgênicos exporem seus argumentos e pontos de vista, a sua leitura deixa evidente o caráter preconceituoso e grosseiro dos supostos críticos.
Um destes "críticos" relata que formou uma "equipe de refutação" chamado "ask-force" (algo como "força tarefa para questionamentos") para desafiar pesquisas sobre a biossegurança de lavouras transgênicas. Das 20 pesquisas já "criticadas" pelo grupo, nenhuma é positiva em relação aos efeitos dos transgênicos."
O principal argumento dos detratores das pesquisas é que elas podem ser usadas por ativistas anti-transgênicos para fomentar ações e influenciar as políticas sobre o tema. Com base nisso, promovem todo o tipo de perseguição.
Ignacio Chapela, um pesquisador da Universidade da Califórnia, em Berkeley, conta que estes ataques estão dissuadindo jovens cientistas a seguir carreiras em pesquisa sobre lavouras transgênicas. "Já tenho uma longa experiência com pessoas jovens que me dizem que não vão para este campo precisamente por serem desencorajados pelo que vêem", diz ele.
Para quem não se lembra, Chapela foi um dos primeiros cientistas a enfrentar este tipo de perseguição. Em 2001 ele publicou um artigo na mesma Nature relatando que variedades crioulas de milho no México estavam contaminadas por genes transgênicos. A reação negativa foi tão forte que, de maneira inédita, a Nature publicou uma nota reconhecendo que "as evidências disponíveis [no estudo de Chapela] não eram suficientes para justificar a publicação da pesquisa". Posteriormente, análises feitas pelo governo mexicano confirmaram a contaminação apontada por Chapela.
É muito importante que estas denúncias comecem a circular em publicações científicas respeitadas. Vamos esperar que estes artigos incentivem outros cientistas intimidados a sair do casulo. Especialmente por aqui: já passou da hora de os nossos pesquisadores começarem também a se indignar e se articularem para desmascarar a defesa pseudocientífica dos transgênicos no Brasil e tentar conter e reverter as atrocidades cometidas pela CTNBio "em nome da ciência".
[1] Battlefield - Papers suggesting that biotech crops might harm the environment attract a hail of abuse from other scientists. Nature|Vol 461|3 September 2009.
Artigo disponível em inglês mediante pagamento:
http://www.nature.com/news/2009/090902/full/461027a.html
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Neste número:
1. Cientista indiano defende moratória aos transgênicos
2. Monsanto pede aprovação nos EUA para soja sem gordura trans
3. O monopólio avança: Dow Chemical e DuPont anunciam acordo para produção de soja GM
4. Terra de Direitos lança boletim sobre a Convenção de Biodiversidade
Sistemas agroecológicos mostram que transgênicos não são solução para a agricultura
Carta Agroecológica de Curitiba 2009
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1. Cientista indiano defende moratória aos transgênicos
O Dr. Pushpa Bhargava, o cientista apontado pela Suprema Corte da Índia para integrar o GEAC, Comitê de Aprovação de Engenharia Genética do país, defendeu uma moratória para as lavouras transgênicas com base em preocupações sobre biossegurança e saúde. Em um artigo publicado na imprensa indiana, Bhargava diz: "Cientistas responsáveis e reputados de todo o mundo identificaram cerca de 30 testes que deveriam ser feitos para determinar a viabilidade funcional e a biossegurança de uma lavoura transgênica. Eu trouxe estes testes para o conhecimento do GEAC imediatamente após ter sido nomeado pela Suprema Corte. Em nenhum lugar do mundo, incluindo a Índia, estes testes foram feitos. Mais de dois terços destes testes, como os experimentos de toxicidade de longo prazo ou de carcinogenicidade, não foram realizados. Alguns testes foram feitos, foram amplamente feitos pelas próprias indústrias, muitas vezes de forma insatisfatória. Os poucos testes que foram feitos por outras organizações respeitáveis utilizaram amostras fornecidas pelas empresas. Nenhum destes testes jamais foi validado por uma organização independente com credibilidade pública e, por isso, não eles não têm valor algum. O GEAC implicitamente acredita na Monsanto e aceitou o que a empresa disse como verdade divina, apesar dos registros bem documentados da sua falta de honestidade, integridade e ética ao longo de décadas".
Fonte:
GMWatch Weekly Watch number 280, 12/11/2009.
- Leia íntegra do artigo, em inglês, em:
http://bit.ly/SQZTd
2. Monsanto pede aprovação nos EUA para soja sem gordura trans
A Monsanto pediu ao USDA (Departamento de Agricultura do governo norteamericano, na sigla em inglês) a aprovação para sua nova soja "Vistive III", desenvolvida com o objetivo de possibilitar a produção de óleos livres de gorduras trans e, ao mesmo tempo, estáveis no calor.
A gordura trans é responsável por elevar os níveis do chamado "mau colesterol" e ao mesmo tempo reduzir os níveis do "bom colesterol", mas é muito útil para a indústria de alimentos por ser altamente estável no calor (o que a torna ótima para frituras) e capaz de prolongar o tempo de prateleira dos produtos industrializados.
Conhecendo a história da Monsanto, os riscos inerentes da transgenia e como são falhos os processos oficiais de avaliação de riscos dos transgênicos, é difícil saber o que é pior: a gordura trans ou a soja transgênica livre dela. Na dúvida, melhor escolher alimentos orgânicos e, sempre que possível, não industrializados.
Com informações de:
Food Navigator USA, 13/11/2009.
http://www.foodnavigator-usa.com/Financial-Industry/Monsanto-asks-regulators-to-approve-trans-fat-free-soy/?c=7MapQmf2N7GtI0fHkVPnyw%3D%3D&utm_source=newsletter_daily&utm_medium=email&u
tm_campaign=Newsletter%2BDaily
3. O monopólio avança: Dow Chemical e DuPont anunciam acordo para produção de soja GM
A Dow AgroSciences, subsidiária da Dow Chemical, e a DuPont anunciaram na semana passada acordo comercial para permitir às duas empresas ampliar sua oferta de produtos tolerantes a herbicidas para a soja durante a próxima década. Pelo acordo, a Dow AgroSciences licencia sem direitos de exclusividade sua tecnologia de transgênicos tolerantes a herbicidas para a soja à Pioneer Hi-Bred, pertencente à DuPont. A Pioneer, por sua vez, licencia sem direitos de exclusividade o Optimum GAT [também tolerante a herbicida] para soja à Dow AgroSciences. As duas empresas cederam uma à outra direitos de usar produtos com suas tecnologias correspondentes. (...) A Dow AgroSciences acredita que poderá iniciar a comercialização desses produtos no início da próxima década na América do Norte, o que dependerá das autorizações necessárias.
Fonte:
DCI - SP, 16/11/2009.
http://www.linearclipping.com.br/MMA/m_stca_detalhe_noticia.asp?cd_sistema=267&cd_noticia=943969
4. Terra de Direitos lança boletim sobre a Convenção de Biodiversidade
A 10ª Conferência de Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) e o 4º Encontro de Partes do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança ocorrerão daqui a menos de um ano, em Nagoya, Japão. E já no próximo mês acontece em Copenhague a 15ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. Estas duas convenções são frutos da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que ocorreu no Rio de Janeiro, em 1992, e juntas constituem o mais importante espaço de debate e deliberação internacional sobre a questão ambiental.
Infelizmente, o conteúdo das negociações em curso não é animador: as negociações são conduzidas sob a lógica de que a conservação da biodiversidade não pode constituir barreira para o mercado e na crença de que apenas a transformação da própria biodiversidade em mercadoria negociável pode gerar um "valor" capaz de fazer surgir o interesse em sua conservação.
A partir deste mês, até a realização da COP 10, na Alemanha, a ONG de direitos humanos Terra de Direitos produzirá informativos bimestrais, comentando os resultados das reuniões. Você pode acompanhar esta discussão pelo site www.terradedireitos.org.br.
O primeiro informativo, intitulado "Podemos ter esperança na política ambiental internacional?" e publicado em 09/11/2009, está disponível em:
http://terradedireitos.org.br/biblioteca/podemos-ter-esperanca-na-politica-ambiental-internacional/
Sistemas agroecológicos mostram que transgênicos não são solução para a agricultura
Carta Agroecológica de Curitiba 2009
Está disponível na internet a Carta Agroecológica de Curitiba 2009, aprovada pelos cerca de 3.800 participantes reunidos em Curitiba (PR) entre 9 e 12 de novembro no VI Congresso Internacional de Agroecologia e II Congresso Latinoamericano de Agroecologia. O tema central dos eventos foi "Agricultura familiar e Camponesa: experiências passadas e presentes construindo um futuro sustentável". Resultado dos trabalhos lá realizados, a Carta Agroecológica afirma:
"A agricultura Latinoamericana e Brasileira passa por uma crise sem precedentes caracterizada por níveis recordes de pobreza rural, fome, migração, degradação ambiental, intensificada pelas mudanças climáticas e as crises energética e financeira. O modelo agrícola industrial exportador e a expansão de monocultivos de transgênicos, agrocombustíveis e agrotóxicos são diretamente responsáveis por essa crise. Está claro que esse modelo convencional é inviável e que a Agroecologia fornece as bases científicas e metodológicas para as estratégias de transição a um novo paradigma de desenvolvimento. A base cultural, social e produtiva desse novo paradigma está especialmente na agricultura familiar e camponesa, fonte fundamental de saber agrícola tradicional, agrobiodiversidade e estratégias de segurança e soberania alimentar."
Reproduzimos aqui apenas alguns dos 19 itens específicos reafirmados pela Carta:
1. O papel da Agroecologia para a mudança de paradigma de desenvolvimento capaz de construir uma agricultura biodiversa, de base familiar e camponesa e resiliente às mudanças climáticas.
2. O compromisso da Agroecologia em transformar essa realidade de iniquidade do campo, promovendo o desenvolvimento rural e a construção de um mundo mais justo, solidário e ambientalmente sustentável;
3. A importância da adoção do enfoque científico da Agroeocologia, cuja base epistemológica pressupõe o intercâmbio dos saberes técnico, científico e popular.
4. O reconhecimento da importância da Agricultura Familiar e Camponesa, e dos saberes dos povos indígenas e tradicionais, para assegurar o fortalecimento do tecido social e da identidade cultural dos povos latinoamericanos, incluindo o acesso a terra, sementes, água e o direito à segurança e soberania alimentar;
14. Que é fundamental para a humanidade manter os centros de origem das espécies cultivadas livres de organismos transgênicos e impedir o patenteamento dos recursos genéticos que permitem o livre intercâmbio de sementes.
A Carta Agroecológica de Curitiba pode ser lida na íntegra em:
http://www.agroecologia2009.org.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=69
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Campanha Brasil Ecológico, Livre de Transgênicos e Agrotóxicos
Este Boletim é produzido pela AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia e é de livre reprodução e circulação, desde que citada a AS-PTA como fonte.
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