ENTREVISTA: CLIVE JAMES |
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O desafio é aliviar a fome |
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La Nacion/Buenos Aires |
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Defesa da biotecnologia: James assegura
que a beleza da transgenia está no fato de ser apropriada aos
pequenos agricultores |
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Quem vê os olhos de uma pessoa morrendo
de fome muda a sua opinião sobre os transgênicos. Isso é o que
garante o pesquisador Clive James, especialista em biotecnologia
agrícola, que se dedica à transferência desse sistema a países em
vias de desenvolvimento. O cientista nascido em Gales, cidadão
canadense por opção, é um dos criadores do Serviço Internacional
para a Aquisição de Aplicações de Agrobiotecnologias e participou do
Foro Biolatina 2000, em Buenos Aires. James viaja nove meses por
ano estabelecendo pontes entre os donos da transgenia e os
agricultores mais pobres, com o propósito que define como o desafio de
aliviar a fome. |
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Pergunta: O ecologista alemão Richard
von Weizcher disse a jornalistas latino-americanos que a Monsanto seria
o diabo. Quem o contestaria? |
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Clive James A alimentação é o maior
desafio que temos pela frente. No ano passado, a população mundial
superou o limite de 6 bilhões de pessoas. Em 2025, seremos 8 bilhões
de seres humanos e, em 2050, chegaremos a 10 bilhões de habitantes.
Isso significa um aumento de 4 bilhões de pessoas nos próximos 50
anos. É uma opinião compartilhada pela comunidade científica mundial,
de que somente a agricultura convencional não poderá aumentar a
produção de alimentos em uma medida equivalente. Juntas, a agricultura
convencional e a geneticamente modificada, talvez sejam capazes de
suprir essa necessidade. É uma razão fundamental para adotar a
biotecnologia. Hoje, 24 mil pessoas morrem diariamente por desnutrição
crônica. Quando a Europa decide não usar essa tecnologia, isso é
moralmente inaceitável. |
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Pergunta As sementes transgênicas
começaram a ser utilizadas em 1992. Oito anos é tempo suficiente para
haver segurança de que não representam riscos? |
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James Vivemos diariamente com riscos. A
Royal Society, a Academia Norte-Americana de Ciências e outras
prestigiosas fundações estudaram minuciosamente essa tecnologia. No
Reino Unido, foram convocadas as mais renomadas personalidades para que
debatessem a transgenia. E fizeram recomendações muito claras.
Primeiro, que existe uma obrigação moral de compartilhar os cultivos
transgênicos com os países em vias de desenvolvimento que queiram
usá-los na luta contra a fome e a pobreza. Depois, analisaram os
cultivos modificados no Reino Unido e chegaram à conclusão que não
há sentido em uma moratória. Acham que deve prosseguir o monitoramento
da biotecnologia, mas consideram que nenhum dos cultivos é perigoso. |
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Pergunta, Em outros países, resultados
coincidem? |
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James Sim. Não existem evidências de
que essas sementes representem riscos. Essa tecnologia tem sido muito
mais controlada do que qualquer outra. Ao contrário dos ambientalistas,
eu diria que o risco ao ambiente é não usar a transgenia, porque não
se corre perigo sem a certeza de que não teremos alimentos suficientes
para o futuro. |
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Pergunta, Por que o senhor acredita que
grupos se opõem tão ferozmente à biotecnologia? |
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James Na Europa, dá para entender a
resistência pela abundância de alimentos. A perspectiva é diferente
quando uma pessoa observa da Tailândia, da China ou da Índia e
comprova que se podem produzir alimentos com maior conteúdo de vitamina
A e reduzir a incidência de cegueira. |
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Pergunta, A transgênia pode
proteger o ambiente? |
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James Os terrenos cultiváveis têm
diminuído. Então, é preciso produzir o dobro de comida na mesma área
ou em menos. E, para proteger as florestas, é necessário encontrar
formas de limitar as áreas de cultivo, que deverão ser sustentáveis,
e de reduzir a aplicação de pesticidas. Assim, será possível
diminuir os perigos ao produtor e à sociedade. |
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Pergunta, A desnutrição se deve à
falta de alimentos ou à distribuição desequilibrada? |
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James Nenhuma estratégia que se
desenvolva para combater a fome e a pobreza pode ter um único enfoque.
A biotecnologia representa um elemento essencial dentro de uma
estratégia geral. Uma parcela de 70% dos pobres do mundo é formada por
agricultores sem recursos. Se for possível oferecer um sistema que
permita elevar a sua produtividade para garantir condições de
alimentar a família, comprar livros e sapatos para os filhos e algo
para a casa, isso é desenvolvimento. A beleza da biotecnologia está no
fato de ser apropriada aos pequenos agricultores. Não acredito, porém,
que seja uma panacéia, e sim um elemento importante na estratégia
múltipla que a sociedade global pode adotar e manter para aliviar a
pobreza e a fome. |
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