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Florestas plantadas em áreas desmatadas contribuem para a biodiversidade

As florestas secundárias, aquelas que crescem em áreas anteriormente desmatadas, são fundamentais para a conservação da biodiversidade e do carbono na Amazônia. É o que diz o mais recente estudo da Rede Amazônia Sutentável (RAS), publicado na revista internacional Global Change Biology. O trabalho avaliou áreas de capoeira, como são chamadas as florestas secundárias, na Amazônia Oriental, e mostrou o papel ecológico que desempenham frente às mudanças climáticas.

Após 40 anos de recuperação natural, as florestas secundárias ainda apresentam uma variedade baixa de espécies de animais e plantas quando comparadas às florestas primárias bem conservadas. Por outro lado, são de vital importância para a conservação ambiental. “Descobrimos que o carbono e a biodiversidade das florestas secundárias recuperaram mais de 80% dos níveis encontrados em florestas primárias não perturbadas”, diz o principal autor do estudo, Gareth Lennox, da Universidade de Lancaster, no Reino Unido.

O trabalho foi realizado por uma equipe internacional de cientistas da Europa, Brasil e Austrália, que mediu o carbono e pesquisou mais de 1.600 espécies de plantas, aves e besouros em 59 florestas secundárias em regeneração natural e 30 florestas primárias não perturbadas na Amazônia Oriental. Os sítios de estudo estão localizados em duas regiões do Pará, nos municípios de Santarém, região oeste do estado, e Paragominas, no nordeste paraense.

As áreas analisadas correspondem a capoeiras jovens (de até dez anos), intermediárias (de 11 a 20 anos) e antigas (a partir de 20 anos). Para a recuperação do carbono e da biodiversidade nessas áreas, o tempo do desmatamento (ou estágio) é um fator-chave. Quanto mais antiga a capoeira, mais a riqueza de espécies de aves, besouros e plantas tende a se aproximar da floresta primária. “Esse é, sem dúvida, um resultado muito positivo para a mitigação das mudanças climáticas e para a conservação da biodiversidade. Mas, ainda assim, as florestas secundárias não podem substituir as primárias, que devem continuar sendo uma prioridade dos esforços de conservação”, alerta o cientista.

Outros fatores também determinam a recuperação da vegetação secundária, como o contexto da paisagem. “Isso significa que, se existem áreas de floresta primária na região, elas contribuem para a recuperação da biodiversidade e do carbono nas capoeiras”, explica Joice Ferreira, pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental e coautora do artigo. “As áreas desse estudo nos mostraram um cenário bastante positivo, pois estão localizadas em regiões onde há mais de 50% da cobertura vegetal primária. Por outro lado, estamos fazendo estudos em outras regiões do estado, nas quais há apenas resquícios de floresta primária, e o cenário pode ser mais preocupante”, revela a cientista da Embrapa.

A estrutura da floresta e a topografia são fatores também analisados pelos especialistas. O aumento da biomassa, por exemplo, que está relacionada à estrutura da floresta, é o que determina a recuperação de carbono nas capoeiras e, consequentemente, exerce forte influência sobre a riqueza de diversidade de aves e besouros. “Quanto mais encorpada a floresta, mais carbono e mais animais ela abrigará”, completa Lennox.

Pesquisa orienta ações importantes

O artigo “Second rate or a second chance? Assessing biomass and biodiversity recovery in regenerating Amazonian forests” (Segunda taxa ou segunda chance? A avaliação da recuperação da biomassa e da biodiversidade na regeneração de florestas na Amazônia) confirma o papel das florestas secundárias para cumprir as políticas de conservação ambiental no País. “O Brasil fez compromissos ousados de restauração florestal”, afirma Joice Ferreira. “Por meio do desafio de Bonn e da Iniciativa 20 x 20, o País se comprometeu a restaurar mais 120 mil km2 de floresta até 2030. Nossos estudos mostram que a regeneração natural oferece serviços ecológicos importantes e sabemos que ela apresenta custos expressivamente mais baixos que a restauração ativa com plantios”, destaca.

No Pará, por exemplo, está em vigor a Instrução Normativa no 8, de 2015, a chamada “Lei das Capoeiras”, que regulamenta a supressão de vegetação secundária no estado. Essa instrução, elaborada com base nas evidências científicas da equipe do artigo, estabelece, por meio de sua idade e quantidade de biomassa, se uma capoeira pode ou não pode ser desmatada. “Esse é um exemplo claro de como o nosso trabalho orienta a tomada de decisão no poder público”, afirma Ferreira.

Os resultados já são mensuráveis: nos últimos 30 anos a área da Amazônia brasileira ocupada por florestas secundárias cresceu de menos de 30 mil km2 para mais de 170 mil km2, mais que o dobro do tamanho da floresta. “Mas ainda há uma considerável incerteza sobre se as florestas secundárias podem atender a padrões ecológicos mínimos e se a regeneração natural ou plantio ativo é a melhor estratégia de restauração”, alerta Toby Gardner, do Instituto Ambiental de Estocolmo (SEI), da Suécia, coautor do artigo. Ele ressalta ainda a importância das iniciativas internacionais, como a Convenção sobre Diversidade Biológica e REDD +, que buscam proteger e aumentar a biodiversidade tropical e os estoques de carbono, em parte, por meio da regeneração florestal.

É certo que biodiversidade e carbono caminham lado a lado nos processos de recuperação de florestas secundárias. E essa constatação da pesquisa é fundamental para a tomada de decisão do poder público. “Florestas secundárias na Amazônia podem, portanto, apresentar um cenário em que todos ganham, no qual investimentos em conservação podem aliviar a mudança climática e proteger espécies tropicais ao mesmo tempo”, finaliza o co-autor do estudo Jos Barlow, cientista na Universidade de Lancaster.

A Rede Amazônia Sustentável (RAS) é um consórcio de 30 instituições brasileiras e internacionais de pesquisa que atua na avaliação da sustentabilidade dos usos da terra na Amazônia desde 2009. São 100 pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento que trabalham na geração de resultados científicos sobre os sistemas produtivos da região, como a pecuária, exploração madeireira, agricultura, e seus impactos sobre a conservação da biodiversidade e do carbono na floresta. “As pesquisas vêm produzindo conhecimento para melhorar nosso entendimento do balanço entre conservação ambiental e desenvolvimento socioeconômico no maior remanescente de floresta tropical do mundo”, afirma o pesquisador britânico, Toby Gardner um dos coordenadores da RAS.

Os trabalhos são desenvolvidos em duas regiões localizadas no estado do Pará, em Paragominas (nordeste), Santarém e Belterra (oeste), que representam as dinâmicas de desenvolvimento do leste da Amazônia. Nos locais há 225 pontos de coletas de dados de diferentes tipos, que geram estudos diversificados. A pesquisadora Joice Ferreira, da Embrapa Amazônia Oriental, diz que o objetivo das pesquisas desenvolvidas pela RAS é quantificar e melhorar o entendimento sobre as consequências ecológicas da perda, degradação e exploração da floresta, bem como das mudanças pela agricultura, incluindo a pecuária e a silvicultura. E também gerar informação para a tomada de decisão no âmbito das políticas públicas para o desenvolvimento da região.

A RAS é coordenada pela Embrapa Amazônia Oriental, Museu Paraense Emílio Goeldi, Universidade de Lancaster (Reino Unido), Instituto Ambiental de Estocolmo (Suécia) e Universidade de Manchester (Reino Unido).

Da Embrapa Amazônia Oriental em 9 de outubro de 2018


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